boca

e de uma vez por todas, ela entendeu. respirou fundo, mas fundo mesmo. consumiu todo o ar do quarto fechado que estávamos. a janela, tentadora, pedia pra ser aberta, mas não, eu não me atreveria a recortar tal momento com o imperceptível movimento que fosse. embora não houvesse necessidade de se dizer mais nada, sabíamos, por nosso histórico de prolixidade, que palavras ainda seriam ditas.
assaz incomodado com meu ruidoso silêncio, pedi pra que ela falasse. entre negaças, eufemismos, hesitações, breves silêncios, elipses, cruzadas de pernas, cruzadas de braços, apócopes, recuos, lapsos, esfregar de olhos úmidos, ela tentou emitir duas dúzias de palavras repletas de sentido – para alguém, não para mim.
restou-me usar a minha boca hábil para impor o silêncio, a concordância e o consentimento.
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